Oi gente!
No Brasil, não pensamos em visitas a cemitérios como pontos turísticos, soa estranho e mórbido para muita gente. Mas em diversos países, os cemitérios são vistos como verdadeiros museus. É o caso do Cemitério da Recoleta, na capital Buenos Aires, na Argentina, que visitamos em julho de 2018. O Cemitério da Recoleta é considerado um museu por dois motivos. Um deles é o grande número de obras de arte encontradas lá, decorando os imponentes mausoléus e abóbodas presentes. A outra razão é porque, no cemitério estão os restos mortais de personalidades famosas da política, cultura, arte e ciência.
História
O Cemitério está localizado no bairro da Recoleta e deve seu nome ao convento dos monges recoletos que ali se encontrava, ao qual também pertencia a vizinha Basílica de Nuestra Señora del Pilar. O cemitério foi construído na antiga horta dos monges. Além disso, merece uma visita por seu valor arquitetônico, pois é uma amostra dos tempos em que o país era uma potência econômica emergente e as principais famílias da Cidade disputavam por construir panteões esplendorosos.
Muitas das abóbadas e mausoléus são obras de importantes arquitetos e estão adornados com mármores e esculturas. Mais de 90 abóbadas foram declaradas Monumento Histórico Nacional. Foi construído em 1822 como o primeiro cemitério público da Cidade e seu traçado é obra do engenheiro francês Próspero Catelin. No final do século XIX, quando as famílias mais abastadas começaram a se mudar para esta zona da Cidade, passou a ser a necrópole preferida delas. As abóbadas são na maior parte das famílias aristocráticas do país. As sepulturas são de propriedade de cada família e cada proprietário deve pagar uma taxa mensal de administração.
O cemitério da Recoleta, assim como o bairro, é bastante caro e reservado às pessoas que possuem boas condições financeiras, portanto, não se trata de um lugar simples, pelo contrário. O metro quadrado mais caro da cidade, está localizado dentro do Cemitério, tanto que a fama do local se iniciou justamente por conta das lápides luxuosas. Para se ter ideia, um túmulo chega a custar US$ 75 mil dólares. Atualmente, novos sepultamentos não são mais feitos, ocorrendo somente a manutenção dos jazigos existentes.
Recentemente, o Governo da Cidade realizou uma restauração da entrada para recuperar seu design e características originais. Dentre as personalidades enterradas no Cemitério do Recoleta figuram líderes políticos, presidentes da Nação, escritores, Prêmios Nobel, esportistas, empresários, heróis da Independência, militares, cientistas e artistas.
Visitas ao Cemitério da Recoleta
O passeio não é para todo tipo de público. Como muita gente diz, temos é que ter medo dos vivos, não dos mortos. Se você também concorda com isso, o passeio é indicado para você, além de ser indicado para quem gosta de esculturas. Esteja ciente que você vai caminhar por vielas cercadas de caixões expostos pois nem todos são enterrados, alguns ficam em gavetas abertas. Algo que pode deixar seu tour mais interessante é conhecer um pouco a história até mesmo surreais das pessoas que estão sepultadas por lá (para que seu passeio não seja apenas “andar e ver túmulos”), além das catacumbas de figuras públicas.
O lugar é tão famoso e tem tantos detalhes e histórias a serem contadas que pode ser conhecido através de um passeio guiado oferecido pelo próprio cemitério. A visita guiada dá muito mais sentido ao passeio e permite conhecer um pouco mais da arquitetura dos túmulos e entender porquê um cemitério pode ser considerado uma atração turística. As visitas são gratuitas, com duração de uma hora.
Muitas celebridades, personalidades e protagonistas da história argentina estão sepultadas lá, incluindo Evita Perón, muito querida pelos argentinos, onde sempre há flores deixadas por seus admiradores. O túmulo dela é um dos mais visitados no cemitério da capital portenha.
Infelizmente, a maioria dos turistas acaba indo lá basicamente para visitar a tumba da Evita, o que é um erro, pois além de ser bem mais simples que as outras, existem muitas histórias interessantes sobre outras pessoas. Antes de viajar para a Argentina, pesquisamos sobre essas histórias surreais e conseguimos encontrar as tumbas de algumas delas.
1. Rufina Cambaceres, a jovem que morreu duas vezes.
Em uma das esquinas do cemitério da Recoleta está uma das tumbas mais belas, a de Rufina, filha do escritor Eugenio Cambaceres. Diz a história que na noite que a menina fazia 19 anos, sua mãe faria uma grande comemoração e a levaria para o teatro, apresentando Rufina para a sociedade. Porém, antes de sair, a menina foi encontrada morta, toda rígida no chão. Um médico confirmou sua morte e no dia seguinte ela foi enterrada.
Alguns dias depois, os empregados do cemitério encontraram seu caixão aberto com a tampa quebrada. A versão oficial diz que foi um roubo, mas o provável é que a Rufina tenha sofrido um ataque de catalepsia e acordado dentro do sepulcro, já que foram encontrados vários arranhões na parte interior do caixão. Uma estátua mostra a menina segurando uma espécie de maçaneta da tumba, como se quisesse sair ou entrar do mundo dos mortos.
2. David Alleno, o coveiro que se suicidou para estrear a própria tumba
David era empregado do cemitério e sonhava em passar a eternidade ali, no endereço fúnebre dos mais ricos. Economizou durante toda sua vida para isso acontecer. Com a ajuda do seu irmão, ele viajou até a Itália, onde encomendou essa escultura. Detalhe: a lápide foi encomendada já com o ano da sua morte, 1910. Quando era perguntado sobre esse macabro detalhe pelos seus colegas de trabalho, David nada dizia.
No dia que sua tumba finalmente ficou pronta, David avisou a administração do cemitério que não trabalharia mais ali. Despediu-se dos colegas e foi embora. Ao chegar em casa se matou com um tiro. No seu túmulo há uma estátua que o representa com sua roupa de trabalho, uma regadeira, uma vassoura, um molho de chaves e os dizeres “David Alleno, cuidador en este cementerio 1881-1910”. Em cima da tumba está o nome do irmão que ajudou a pagá-la, Juan Alleno.
3. Liliana Crociati e a conexão com seu cachorro
Visita Guia no túmulo de Liliana
Em 1970, Liliana morreu numa avalanche durante sua lua de mel na Áustria, na cidade de Innsbruck. No mesmo dia, separado por mais de 14 mil quilômetros de distância, seu cachorro Sabú, que era muito especial para a jovem, também faleceu na Argentina. Os pais construíram uma abóbada onde reproduziram o dormitório dela e colocaram sua escultura na entrada, luzindo seu vestido de noiva com o qual foi sepultada e acompanhada por seu inseparável cachorrinho.
Estátua de Liliana e o seu Cão
4. Salvador María del Carril e Tiburcia Dominguez, o rancor eterno
Salvador María del Carril foi vice-presidente constitucionalista, governador de San Juan e Ministro de Governo, porém ele é lembrado no cemitério pelo péssimo relacionamento que tinha com sua esposa Tiburcia. Depois de uma briga horrível, eles se deixaram de falar e assim ficaram por mais de 30 anos. Del Carríl inclusive fez uma carta pública dizendo que estava cansado das dívidas da mulher e não pagaria mais nenhum centavo do que ela devia.
Quando ele faleceu, sua esposa fez um mausoléu lindíssimo para o marido, com uma estátua olhando para o sul. quinze anos depois, quando Tiburcia morreu, seu último desejo era que seu busto fosse colocado de costas para o de Del Carril, já que seu ódio duraria toda eternidade. Continuam sem se falar e se olhar desde então.
Encontramos os bustos de Tiburcia e Salvador
5. Elisa Brown, a noiva do Rio da Prata
Elisa Brown, filha do famoso almirante Brown, estava esperando a volta do seu noivo, o comandante Francis Drummond, que estava lutando na Guerra Cisplatina, sob as ordens do sogro. Na batalha de Monte Santiago, Francis morre nos braços do Almirante. Sua última vontade foi que entregassem a Elisa o relógio que ele estava usando.
Meses depois da morte do marido e desesperada por não conseguir viver sem seu amor, Elisa se joga ao Rio da Prata com o vestido de noiva que havia sido encomendado para seu casamento e morre afogada. Seus restos estão dentro de uma urna que foi feita com o bronze fundido de um dos canhões da embarcação que Francis usou na guerra.
Como chegar ao Cemitério de Recoleta
O cemitério fica em um dos bairros mais movimentados de Buenos Aires, a Recoleta. Para chegar até lá, você pode pegar o metrô e descer na estação Las Heras, que fica a 850 metros do cemitério.
Endereço: Junín 1760
Horário: todos os dias das 8 às 18hs.
Entrada: Gratuita
Linhas de ônibus: , 17, 61, 62, 67, 92, 93, 10, 37, 38, 41, 59, 60, 95, 101, 102, 108, 118, 124, 130.
A pé: da Praça San Martín e Rua Florida caminhar pela Avenida del Libertador 10 quarteirões.
Pessoas famosas enterradas no cemitério
Eva Duarte de Perón (Evita): (1919-1952), esposa do general Juan Domingo Peron. Trabalho na área social e foi considerado o Defensora dos trabalhadores.
Domingo Faustino Sarmiento (1811-1888) político, escritor e presidente da Argentina entre 1874-1868.
José Marmol: (1817-1871) poeta e escritor.
José C. Paz: (1842-1912) advogado e jornalista. Ele fundou o jornal La Prensa.
Remedios Escalada de San Martin, esposa do General San Martín.
Guillermo Brown (1777-1857) Irlandês, o almirante e criador da marinha que participaram nas lutas pela independência.
Carlos Maria de Alvear: (1789-1852) soldado que se destacou na luta pela independência americana.
Juan Lavalle: (1797-1841) político e militar. Foi governador da província de Buenos Aires.
Leandro N. Além: (1842-1896) advogado, escritor, poeta e político. Organizou a União Cívica Radical.
Hipólito Yrigoyen: (1850-1933) foi presidente da Argentina duas vezes. Seu último cargo foi interrompido por um golpe militar.
Raúl Alfonsín: advogado e político. Ele foi presidente da Argentina entre 1983 e 1989.
Arturo Illia: (1901-1983) médico e político. Ele foi presidente da Argentina entre 1963 e 1966, seu governo foi derrubado por uma junta militar.
Luis Angel Firpo: (1895-1960) do pugilista peso pesado conhecido como "o touro selvagem dos pampas".
Federico Leloir, (1906-1987) médico e cientista. Ganhador do Prêmio Nobel de Química em 1970.
Victoria Ocampo (1891-1979) escritora e editor. Amiga de Jorge Luis Borges. Abriu sua casa para figuras importantes, como Igor Stravinsky e Le Corbusier.
Os artistas e escultores que têm obras no Cemitério da Recoleta: Luis Perlotti - Carlos Romairone, Rene Sargent - Alfredo Bigatti, José Fioravanti, Jean Alexandre Falguière, Miguel Sansebastiano - Antonin Mercie, Luis Carriere - Pedro Zonza Briano, Alfredo Guttero - Tasso.








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